quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Guerra ao Terror


O maior mico cinematográfico de 2009 no Brasil pertence à distribuidora de Guerra ao Terror. Influenciada pelo pouco sucesso no país dos filmes sobre os conflitos recentes no Iraque e Afeganistão, a Imagem Filmes decidiu lançar a obra direto em DVD antes mesmo da estréia do filme nos cinemas americanos. Meses depois, o longa de Kathryn Bigelow já havia vencido quase todos os prêmios e festivais dos quais participou, culminando com as nove indicações ao Oscar nesta semana – largando como um dos principais favoritos.
Percebendo a besteira que fez, além de querer faturar mais com a visibilidade que o Oscar traz para o filme, Guerra ao Terror chega finalmente aos cinemas brasileiros nesta sexta-feira. O filme acompanha três especialistas em bombas do exército norte-americano com a difícil tarefa de localizar e desarmar estes artefatos, num trabalho que mistura o risco iminente de morte e a alta adrenalina. É dessa premissa simples que Bigelow fez aquele que já está sendo chamado lá fora de “o novo Platoon”.
Mas ao contrário do filme de Oliver Stone (curiosamente, o último filme sobre uma guerra moderna a vencer o Oscar, em 87), Guerra ao Terror foge das discussões políticas em torno do conflito, evitando os já extensos discursos antiguerra presente em inúmeras outras obras. Não que aqui eles estejam ausentes, mas a mensagem é muito mais sutil. Bigelow se preocupa mais em estudar as sequelas que os conflitos causam na mente humana e em como aqueles que participam de uma guerra são incapazes de escapar incólumes de suas consequências.
Ajuda neste aspecto a belíssima interpretação de Jeremy Renner como William James, um experiente soldado que entra para a equipe depois que um dos integrantes morre ao tentar desarmar um explosivo. Ele é o arquétipo do herói de guerra: corajoso, ousado, arrogante, mas com uma ponta de sentimento, um restante de humanidade que mesmo o pior conflito não consegue apagar. O caminho do personagem – que volta para a casa só para perceber que a guerra deixou sequelas demais para se viver naquele mundo “normal” – representa o maior trunfo do ótimo roteiro de Mark Boal.
Bigelow filma tudo apostando num grande realismo, como se nós mesmos estivéssemos dentro do conflito. As cenas em que os personagens têm que desarmar alguma bomba sempre são tensas e não se tornam repetitivas. A presença dos paisanos que observam seus trabalhos – e que podem ser tanto pessoas comuns curiosas quanto o próprio inimigo – ajudam a gerar uma apreensão constante nos espectadores. Três sequências se destacam e ficaram bastante tempo na memória de quem assiste o filme: a primeira quando William tem que desarmar um explosivo que se localiza dentro de um carro; a segunda durante um tenso duelo de armas de alta-precisão no meio do deserto, que faz lembrar mais um faroeste que um filme de guerra comum; e por fim, já próximo ao fim do filme, numa cena que se passa à noite e em que Bigelow (junto com o fotógrafo Barry Ackroyd) jogam os personagens numa escuridão total contraposta apenas às cores quentes do fogo ao redor, ilustrando o terror e as incertezas do conflito.
Contando com participações rápidas – quase pontas – de atores mais conhecidos do público, como Guy Pierce e Ralph Fiennes, Guerra ao Terror é a prova de que ainda dá para produzir uma obra rica em significados em um gênero tantas vezes já trabalhado. E num gênero considerado masculino, Kathryn Bigelow conseguiu captar com perfeição como é estar dentro de uma guerra de verdade.

The Hurt Locker (2009) - Dirigido por Kathryn Bigelow; Com Jeremy Renner, Anthony Mackie, Brian Geraghty, Guy Pearce, Ralph Fiennes, David Morse, Evangeline Lilly e Christian Camargo.

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