quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

O Discurso do Rei


Existe um determinado tipo de filme que parece ter sido feito para receber prêmios. Essas obras geralmente ficam apenas no feijão com arroz, simples, mas eficientes. Contam histórias dramáticas, bem construídas e que funcionam bem para o público em geral. Infelizmente, a falta de ousadia acaba relegando-os ao esquecimento pouco tempo depois. Em épocas de Oscar, esses filmes aparecem aos montes. Nos últimos anos, vinham sofrendo fracassos constantes, já que a principal premiação do cinema norte-americano dava mostras de que tinha se modernizado ao consagrar obras mais relevantes cinematograficamente. Mas este ano esse fantasma volta a rondar a Academia e tudo indica que o inglês O Discurso do Rei - um clássico "filme de Oscar" - deve levar as principais estatuetas.

Dirigido por Tom Hooper - que antes deste longa havia realizado apenas um filme sobre a curta passagem do técnico Brian Clough pelo clube inglês Leeds United, além de séries de TV -, O Discurso do Rei narra a história de George VI (Colin Firth) que tenta superar sua gagueira para poder assumir o trono britânico. Às vésperas da Segunda Guerra Mundial e com a popularização do rádio como meio de comunicação de massa, a realeza precisa aprender a se comunicar bem para não perder o prestígio. Para isso, conta com a ajuda do excêntrico Lionel Logue (Geoffrey Rush), um ator fracassado que dá aulas de dicção e “cura” problemas como o do futuro rei.

Hooper tenta retratar o deslocamento de George VI, que nunca almejou o trono e é forçado pelas circunstâncias a fazê-lo, enquadrando Firth muitas vezes no canto da tela, além de apostar em ângulos pouco usuais, demonstrando a estranheza do ambiente e do estado de espírito de seu protagonista. O problema é que em outros momentos o diretor realiza tomadas mais convencionais, quebrando essa interpretação e fazando parecer que não existe um propósito para essas escolhas, além de exibicionismo do cineasta. Outro grande equívoco é abordagem que o roteiro de David Seidler dá ao filme, que é quase uma ode à monarquia, relegando figuras históricas como Winston Churchill a papéis irrelevantes – é como se a Guerra tivesse sido vencida não pela habilidade política do primeiro-ministro mas apenas pela presença de espírito de George VI.


O que acaba tornando O Discurso do Rei em um bom filme são as belíssimas atuações de seu elenco. A começar por Colin Firth, que pelo segundo ano seguido tem uma performance espetacular (ano passado foi com Direito de Amar). Compondo um rei contido e claramente avesso a aparições públicas, Firth retrata com realismo as dificuldades de George VI em se expressar. Em contraste, o Lionel Longue de Geoffrey Rush esbanja energia e vivacidade. Rush, aliás, diverte-se bastante no papel do animado professor, sendo o maior destaque do longa depois de Firth. Já Helena Bonham Carter demonstra com eficiência o carinho que a rainha sente pelo marido, exibindo um olhar triste e piedoso sempre que ele se encontra em situações constrangedoras por causa da gagueira. Enquanto isso, Guy Pearce é o único que destoa do elenco, já que seu Eduardo VIII é quase uma caricatura, culpa também do roteiro que desenvolve pouco o personagem - uma figura tão interessante quanto o protagonista.

Apostando em reviravoltas dramáticas criadas apenas para dar peso ao filme, O Discurso do Rei funciona bem como drama, apesar de suas falhas evidentes. Sua provável vitória no Oscar indicaria sim um retrocesso, mas não seria nenhum vexame colossal como em outras ocasiões. Pena que o filme deva ser esquecido facilmente poucos meses depois.

The King's Speech (Reino Unido, Austrália, EUA; 2010). Dirigido por Tom Hooper. Com Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham Carter, Guy Pearce, Michael Gambon, Derek Jacobi e Timothy Spall.

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