sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Lincoln


Os norte-americanos possuem, entre várias outras características marcantes, um orgulho de sua história e de seus principais personagens que muitas vezes beira ao fanatismo. É o caso, por exemplo, de Abraham Lincoln, o 16° presidente daquele país. Foi durante seu mandato que ocorreu a sangrenta guerra de secessão, opondo o sul escravista e o norte abolicionista, conflito só se encerrou após o fim da escravidão. A morte trágica do presidente, assassinado em um teatro meses depois de aprovada a medida, ajudou a consolidar ainda mais a sua história como a de um mártir da liberdade e da igualdade.

Durante anos o diretor Steven Spielberg tentou transformar em filme a história de Lincoln. Diretor que ajudou a revolucionar o cinema norte-americano nos anos 1970, Spielberg sempre foi conhecido pelos exageros nos filmes dramáticos, carregando a mão na pieguice e no sentimentalismo até mesmo em seus trabalhos mais eficientes (basta assistir aos finais de A Lista de Schindler e O Resgate do Soldado Ryan para ver dois exemplos). Ao adaptar a biografia do ex-presidente, podia-se esperar mais um espetáculo choroso e forçado vindo do diretor, assim como em trabalhos que tratavam do mesmo tema, os dramáticos - até demais - A Cor Púrpura e Amistad. Mas não é o que acontece. Pelo contrário: Lincoln não é apenas um filme inteligente e muito bem planejado, como também é o melhor trabalho de Spielberg desde o ótimo Munique.

Muito dessa auto-disciplina do diretor é fruto do brilhante roteiro de Tony Kushner. Concentrando-se exclusivamente nos dias finais da guerra civil, o filme acompanha as negociações para a aprovação da 13ª emenda à constituição americana, que põe fim de vez à escravidão. Detalhista ao estremo, Kushner nos coloca a par de todos os percalços políticos pelos quais passam o presidente e seus apoiadores: desde as tentativas para convencer as correntes radicais e conservadoras do partido republicano (o mesmo do presidente) até a negociação com os opositores democratas, com direito a ofertas de cargos públicos, lobby ou mesmo subornos. Tudo isso ao mesmo tempo em que retrata a habilidade retórica do presidente: representado como uma figura profundamente carismática, como um contador de histórias exímio, e como um político corajoso, Lincoln cria um retrato bastante positivo do presidente, mas sem se transformar em uma hagiografia.



Trabalhando com um roteiro que investe mais na inteligência do que no sentimento, Spielberg tem a oportunidade de demonstrar seu talento como contador de histórias. Apesar da complexidade das negociações políticas e dos vários personagens que passam pela tela, em nenhum momento o espectador fica confuso ou perdido, graças à habilidade narrativa do cineasta e de sua equipe. Reparem, por exemplo, na perfeita mise-en-scène do momento em que são introduzidos os republicanos radicais e seu líder, Thaddeus Stevens: mostrando inicialmente apenas a argumentação de seus interlocutores, Stevens só aparece em campo quando resolve se pronunciar, atraindo a atenção dos presentes; e, então, com um corte para o contraplano e um sutil movimento da câmera finalmente o político é mostrado - e a beleza do movimento é auxiliada, também, pela iluminação perfeita do fotógrafo Janusz Kaminski, parceiro habitual do diretor. Kaminski, aliás, realiza aqui um de seus melhores trabalhos, apostando numa iluminação mínima, destacando silhuetas e mergulhando seus personagens nas sombras dos bastidores da política. Da mesma forma, a montagem de Avy Kaufman jamais faz o filme parecer cansativo: o ritmo é acelerado nas sequências que envolvem as tentativas de influenciar o voto dos congressistas, mas volta à calmaria nas situações mais tensas e intimistas.

Mas quem rouba o filme inteiramente é Daniel Day-Lewis. Beneficiado pelo roteiro inspirado, seu Lincoln consegue cativar até mesmo os inimigos e rivais, graças à eloquência e ao carisma. Seu olhar simpático e a impressão de estar sempre sorrindo ao contar suas famosas histórias escondem uma figura exausta, curvada pela idade e pelo peso do cargo que ocupa. Sua atenção aos detalhes impressiona: desde a voz cansada, passando pela entonação, pelos gestos e pelo olhar, tudo é calculado com a mínima precisão; é como se estivéssemos vendo o Lincoln de verdade. A interpretação de Lewis é o que move o filme, fazendo com que o espectador enxergue com clareza o porquê daquela figura ser tão admirada, e certamente merece todos os prêmios que vem recebendo, incluindo o seu provável terceiro Oscar de melhor ator (um feito inédito na categoria).

Mas não é apenas Day-Lewis que brilha: o Thaddeus Stevens de Tommy Lee Jones também é uma figura crucial para compreendermos a importância daquele momento histórico e suas consequências para o futuro. Mais radical do que o presidente - já que é favorável não apenas ao fim da escravidão, como também ao de qualquer tipo de discriminação -, Stevens se vê obrigado a negar alguns de seus princípios a fim de que a emenda seja aprovada; e, de certa forma, ao negá-los está contribuindo para que os negros continuem sofrendo, já que, mesmo livres, só teriam seus direitos civis garantidos dali a quase um século. Também retratado como uma figura cansada e frágil pela vida dedicada à política (algo facilmente notado pela sua dificuldade em locomoção), Stevens é talvez o elo moral mais importante o filme, e a atuação de Jones é sutil na medida certa. Da mesma forma, Sally Field dá graça e emociona como a primeira-dama Mary Todd Lincoln, protagonizando alguns dos momentos mais tocantes do filme. Aliás, todo o elenco de Lincoln é espetacular, contando com atores talentosos como Joseph Gordon-Levitt, Hal Holbrook, David Strathairn, John Hawkes, Jackie Earle Haley, Michael Stuhlbarg, James Spader, entre outros.

Mesmo tropeçando no final - e Spielberg mais uma vez retoma o seu sentimentalismo piegas ao retratar desnecessariamente a morte do presidente -, Lincoln é um filme muito bem realizado tanto tecnicamente quanto em termos narrativos. E o importante momento histórico que retrata não só encontra eco com a atual situação da política americana (quando um presidente negro acaba de tomar posse para seu segundo mandato), mas também representa a volta por cima de um diretor que vinha de uma série de trabalhos irregulares.

Lincoln (EUA, 2012). Dirigido por Steven Spielberg. Com Daniel Day-Lewis, Sally Field, Tommy Lee Jones, David Strathairn, Joseph Gordon-Levitt, Hal Holbrook, David Costabile, John Hawkes, James Spader, Tim Blake Nelson, Jackie Earle Haley, Bruce McGill, Joseph Cross, Jared Harris, Lee Pace, Peter McRobbie, Gulliver McGrath, Gloria Reuben, Michael Stuhlbarg, Jeremy Strong, Boris McGiver e Walton Goggins. 


domingo, 20 de janeiro de 2013

Argo


A carreira de Ben Affleck é singular. Depois de ganhar um Oscar de melhor roteiro, junto com seu parceiro - e também ator - Matt Damon, por O Gênio Indomável, em 1998, firmou-se como galã hollywoodiano, estrelando alguns sucessos de bilheteria. Ator bastante limitado, viu sua carreira afundar em trabalhos burocráticos e esquemáticos, chegando ao fundo do poço na primeira metade da década passada. Quando quase ninguém mais levava seu nome a sério, começou a investir na carreira de diretor, na qual até agora, surpreendentemente, mostrou-se muito competente. Argo, seu terceiro filme por trás das câmeras, é o melhor de sua carreira e tem sido apontado como a volta por cima do ator - e agora diretor. Uma típica história de superação que Hollywood tanto ama.

Outro fato que a indústria do cinema adora é afirmar sua importância cultural. E isso explica, em partes, o grande sucesso de Argo nessa temporada de prêmios. O filme se passa no início de 1980, meses depois da revolução islâmica liderada pelo aiatolá Khomeini, que derrubou do poder no Irã o xá Reza Pahlevi. Depois de os EUA darem asilo político ao xá (que sofre com um câncer), a população iraniana, ensandecida e exigindo a volta de seu antigo governante para que seja julgado pelos crimes que cometeu, invade a embaixada americana e promete que só liberará seus funcionários em troca da volta de Pahlevi ao país. Seis destes reféns conseguem escapar; e é aí que entra em ação o agente da CIA Tony Mendez (Affleck), convocado para resgatá-los da casa do embaixador canadense, onde estão refugiados. Mas o plano de resgate é um tanto mirabolante: começar a produção de um filme falso (chamado "Argo") e fingir ir ao Irã em busca de locações, como forma de entrar e sair do país de forma segura e sem chamar atenção das autoridades iranianas.

Mistura de thriller com suspense político, Argo se beneficia da direção segura de Affleck e do ótimo roteiro de Chris Terrio. Isso fica claro nas mudanças de tom que ocorrem durante a narrativa: nas cenas passadas em Los Angeles, a narrativa surge mais leve, quase cômica, em contraponto à tensão vista durante as sequências que envolvem a preparação dos fugitivos e a fuga em si. É preciso louvar, também, o brilhante trabalho de montagem realizado por William Goldenberg, que dá o ritmo certo a todo a história. Chamam a atenção duas sequências: aquela em que as leituras do roteiro do filme e da carta de exigência dos sequestradores são intercaladas; e todo o ato final, da correria dentro do escritório da CIA aos transtornos nos estúdios de Los Angeles, passando, claro, pelas tensas cenas no aeroporto.



Outro ponto alto de Argo é o seu elenco homogêneo. Alan Arkin e John Goodman transformam seus personagens - o produtor (fictício) Lester Siegel e o maquiador (real) John Chambers - em mais do que um alívio cômico, servindo como guias dos percalços pelos quais passam a produção de qualquer filme em Hollywood. Da mesma forma, Bryan Cranston dosa muito bem os momentos de calma e de explosão do chefe de Mendez, Jack O'Donnell. É injusto, portanto, que apenas Arkin esteja sendo reconhecido na temporada de prêmios, com os três coadjuvantes exercendo atuações fundamentais para o sucesso do filme. E até mesmo Affleck atua bem; sua inexpressividade serve ao personagem, um agente secreto que não deve transparecer emoções. Além disso, o ator toma algumas decisões interessantes e sutis, como quando ele olha para cima aliviado depois que os guardas do aeroporto autorizam a passagem da falsa equipe de filmagem, mesmo sem os documentos necessários.

Mas no fundo, o verdadeiro tema de Argo, mais do que a crise iraniana em si, é a forma como o cinema pode resolver problemas unindo povos e culturas. Afinal, foi somente através da farsa cinematográfica que uma tragédia foi evitada. O papel da linguagem audiovisual como peça de propaganda ou como válvula de escape da dura realidade é citado durante o longa, seja durante a já mencionada sequência que alterna a leitura do roteiro com as exigências dos sequestradores, seja no diálogo entre Mendez e o funcionário do Ministério da Cultura iraniano, que afirma apoiar a produção do filme para "melhorar a imagem do país" (é curioso - e confirma ainda mais o aspecto propagandístico do cinema - que o Irã agora comece a financiar um filme em resposta a Argo, dessa vez mostrando os americanos como vilões). E a maior prova de que o cinema é uma arte universal é que até mesmo a truculenta guarda revolucionária do Irã consegue ficar maravilhada apenas ao imaginar um filme que não existe - detalhe que Affleck e Terrio fazem questão de mostrar.

Que Ben Affleck abandone de vez seus papéis de galã inexpressivo e continue fazendo filmes como este, seja na frente ou, principalmente, por trás das câmeras.

Argo (EUA, 2012). Dirigo por Ben Affleck. Com Ben Affleck, Bryan Craston, Alan Arkin, John Goodman, Victor Garber, Tate Donovan, Clea DuVall, Scoot McNairy, Rory Cochrane, Christopher Denham, Kerry Bishé e Sheila Vand.


sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Django Livre


Mestre das referências, das homenagens e das citações cinematográficas, Quentin Tarantino parece ter chegado em um momento da carreira em que seu estilo deixa de ser novidade e passa a se tornar repetição. Django Livre, seu sétimo filme em pouco mais de 20 anos como diretor, possui as características básicas de sua filmografia - histórias movidas pelo diálogo, pela violência explícita e pela reverência aos gêneros cinematográficos -, mas já dá sinais de desgaste dessa fórmula. Seus bons momentos fazem o longa valer a pena, mas ainda assim parecem cópias inferiores de situações vistas anteriormente.

Desta vez homenageando o blaxploitation e o western spaghetti - subgêneros também trabalhados em obras como Jackie Brown, Kill Bill e À Prova de Morte -, Django Livre acompanha o personagem título (Jamie Foxx), um escravo do sul dos Estados Unidos, posto em liberdade por um dentista caçador de recompensas, King Schultz (Christoph Waltz), para que possa auxiliá-lo na busca por um bando foragido. Posteriormente, quando o companheirismo entre os dois se fortalece, Schultz promete ajudar Django a libertar sua esposa Broomhilda (Kerry Washington), escrava do rico fazendeiro Calvin Candie (Leonardo DiCaprio). Um enredo simples, mas que nas mãos de Tarantino tende a se transformar em espetáculo pop.

É o que acontece aqui, mas em menor escala em relação às produções anteriores do diretor e roteirista. Há poucos diálogos memoráveis, sendo que o único monólogo notável envolve o personagem de DiCaprio e um crânio - aliás, toda a sequência da negociação final entre Candie e Schultz é muito bem escrita, resultando num dos principais momentos do filme. Tarantino continua criando personagens singulares, como Django, Schultz e Candie, além de Stephen, escravo vivido por Samuel L. Jackson. As atuações, aliás, são o ponto alto do longa, beneficiadas, é claro, pelo roteiro. É o caso de Waltz, que assim como em Bastardos Inglórios, rouba o filme para si - e vem sendo indicado a prêmios pelo papel. Mas mesmo seu dr. Schultz se empalidece à frente do brilhante coronel Hans Landa, do filme anterior.



E esse é o maior problema de Django Livre: a impressão de que tudo que acontece em tela é uma versão pobre de sequências vistas em outros filmes do cineasta. Sim, a discussão envolvendo as máscaras dos cavaleiros de uma espécie de pré-Klu Klux Klan é divertida, mas lembra muito o diálogo sobre os codinomes da gangue de Cães de Aluguel. Outro momento que remete ao primeiro longa do diretor é quando ocorre a quase mutilação do protagonistas - só que, ao invés de vermos Michael Madsen em cena, temos Walton Goggins. E se o tiroteio envolvendo Django e vários capangas de Candie chama atenção pela forma ao mesmo tempo sangrenta e cômica como é filmada, ele nos remete ao confronto da Noiva com os cem ninjas em Kill Bill. É como se Tarantino, além de homenagear os gêneros que fomentaram sua paixão pelo cinema, também começasse a revisar sua própria cinematografia.

E não é só em termos de roteiro que Django Livre fica aquém dos outros trabalhos do diretor. Tecnicamente, o filme também tem problemas. Desta vez apostando em uma narrativa mais linear, sem as idas e vindas do tempo características de seus primeiros trabalhos, a montagem sofre com o ritmo - sinal claro da tumultuada produção do longa. O último ato é bem corrido, dando a impressão de que a história precisa urgentemente ser finalizada, o que pode ser constatado também pela própria duração do filme: mais de duas horas e quarenta minutos. Da mesma forma, a fotografia, mesmo contando com planos inspirados e iluminação precisa, fica aquém da beleza plástica de obras como Kill Bill ou Bastardos Inglórios - o que, se tratando de um western, é um problema.

Contando com uma breve participação de Franco Nero, o Django original do filme dirigido por Sergio Corbucci em 1966, Django Livre tem seus momentos de brilhantismo e outros que soam como mais do mesmo. Prova de que talvez Tarantino precise se reciclar para não se tornar uma paródia de si mesmo.

Django Unchained (EUA, 2012). Dirigido por Quentin Tarantino. Com Jamie Foxx, Christoph Waltz, Leonardo DiCaprio, Kerry Washington, Samuel L. Jackson, Walton Goggins, Dennis Christopher, Laura Cayouette, James Remar, David Steen, Ato Essandoh, Sammi Rotibi, M. C. Gainey, Brunce Dern, Cooper Huckabee, Jonah Hill e Franco Nero.


terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Apostas para o Oscar 2013

Vai começar a temporada do Oscar. Este ano, as indicações saem mais cedo, o que acabou gerando algum tumulto e tornando as apostas (um pouco) mais difíceis de serem feitas. Como tradição, publico aqui aqueles que eu acho que serão indicados na próxima quinta-feira, desta vez apostando em quase todas as categorias (só deixei de fora aquelas que envolvem curtas, que são muito complicadas de prever). Para cada categoria, escrevo aqueles que acredito que serão indicados, na ordem do mais provável para o menos provável, além daqueles que correm por fora. Vamos lá:

Melhor Filme

Minhas apostas: Lincoln, A Hora Mais Escura, Argo, Os Miseráveis, O Lado Bom da Vida, As Aventuras de Pi, Django Livre e Indomável Sonhadora

Também têm chances: Moonrise Kingdom, Amor, 007 - Operação Skyfall, O Exótico Hotel Marigold, O Mestre

Os seis primeiros filmes da lista são apostas garantidas. Como os indicados podem variar até dez, é bem complicado prever quantos serão. Eu dou certo como oito, mas podem ser mais (como no ano passado). Django Livre ganhou força desde o Globo de Ouro e Indomável Sonhadora é o indie do ano. Ambos foram indicados pelo Sindicato dos Produtores. A curiosidade é se Skyfall conseguirá emplacar uma indicação, sendo o primeiro filme sobre 007 a conseguir tal feito - e no ano da comemoração dos 50 anos da franquia. Acho improvável, mas tudo é possível.

Melhor Diretor

Minhas apostas: Ben Affleck (Argo), Steven Spielberg (Lincoln), Kathryn Bigelow (A Hora Mais Escura), Ang Lee (As Aventuras de Pi) e Michael Haneke (Amor)

Também têm chances: Tom Hooper (Os Miseráveis), David O. Russell (O Lado Bom da Vida)Quentin Tarantino (Django Livre)

Uma das categorias mais difíceis de prever, com uma concorrência acirrada. Affleck, Spielberg e Bigelow são nomes certos. Lee vem sendo lembrado e foi indicado ao DGA, então o considero dentro também. O mesmo valeria para Hooper, mas seu nome é o mais fraco entre aqueles indicados pelo Sindicato dos Diretores. Por isso, vejo chances para Tarantino emplacar, assim como Russell. É preciso lembrar também que a Academia costuma homenagear diretores estrangeiros de renome que se destacaram no ano mesmo não emplacando Melhor Filme (como Julian Schnabel por O Escafrando e a Borboleta em 2008 e Fernando Meirelles por Cidade de Deus em 2003), então há chances para Haneke. Estou apostando neste último, mas qualquer um dos outros tem chances.

Melhor Ator

Minhas apostas: Daniel Day-Lewis (Lincoln), Denzel Washington (O Voo), John Hawkes (As Sessões), Hugh Jackman (Os Miseráveis) e Bradley Cooper (O Lado Bom da Vida)

Também têm chances: Joaquin Phoenix (O Mestre), Richard Gere (A Negociação), Jean-Louis Trintignant (Amor)

O favorito para ganhar, disparado, é Day-Lewis. Phoenix, que parecia ser o único concorrente, ficou fora do SAG e perdeu muita força, sendo provável que fique de fora. Acredito que os indicados serão os mesmos do SAG, com pouca possibilidade de surpresas.

Melhor Atriz

Minhas apostas: Jennifer Lawrence (O Lado Bom da Vida), Jessica Chastain (A Hora Mais Escura), Marion Cotillard (Ferrugem e Osso),Naomi Watts (O Impossível) e Emmanuelle Riva (Amor)

Também têm chances: Quvenzhané Wallis (Indomável Sonhadora), Helen Mirren (Hitchcock), Rachel Weisz (The Deep Blue Sea)

A disputa pela estatueta será entre Lawrence e Chastain. Tirando as duas, nenhuma outra indicação é certeza. Cotillard vem sendo lembrada nas premiações até agora, mesmo por um filme francês (aliás, seria sua segunda indicação, ambas por filmes de sua terra natal). Watts também vem se consolidando. A última vaga da lista deve ficar com uma de duas atrizes com diferentes tempos de carreira: a veterana Riva, do alto de seus 85 anos, e a amadora Wallis, com pouco mais de 9. Para a primeira, a indicação seria uma homenagem pela carreira - além de seu desempenho memorável no filme de Haneke. Já para a segunda, seria um reconhecimento - e o Oscar adora homenagear crianças com atuações marcantes, principalmente nas categorias femininas. Aposto mais em Riva.

Melhor Ator Coadjuvante

Minhas apostas: Tommy Lee Jones (Lincoln), Philip Seymour Hoffman (O Mestre), Alan Arkin (Argo), Robert DeNiro (O Lado Bom da Vida) e Javier Bardem (007 - Operação Skyfall)

Também têm chances: Matthew McConaughey (Magic Mike), Leonardo DiCaprio (Django Livre), Christoph Waltz (Django Livre)

Pouco espaço para surpresas aqui, ao menos aparentemente.


Melhor Atriz Coadjuvante

Minhas apostas: Anne Hathaway (Os Miseráveis), Sally Field (Lincoln), Helen Hunt (As Sessões), Nicole Kidman (The Paperboy) e Maggie Smith (O Exótico Hotel Marigold)

Também têm chances: Amy Adams (O Mestre), Judi Dench (O Exótico Hotel Marigold), Ann Dowd (Compliance), Maggie Smith (Quartet)

Hathaway e Field estão garantidas - e devem brigar pela estatueta, com maiores chances para a primeira. Acredito que Hunt e Kidman também são nomes certos na categoria. Maggie Smith e Amy Adams devem lutar pela última vaga, com vantagem de Smith pelo fato de ter sido indicada ao SAG e Adams não.

Melhor Filme Estrangeiro

Minhas apostas: Amor (Áustria), Intocáveis (França), O Amante da Rainha (Dinamarca), Além das Montanhas (Romênia) e No (Chile)

Outros concorrentes: War Witch (Canadá), Kon-Tiki (Noruega), The Deep (Islândia), Sister (Suíça)

Uma categoria sempre difícil de prever. Amor e Intocáveis são favoritos e se um deles ficar de fora seria uma grande surpresa.

Melhor Animação

Minhas apostas: Valente, Frankenweenie, Detona Ralph, ParaNorman e O Gato do Rabino

Também têm chances: A Origem dos Guardiões, Hotel Transilvânia, Le Tableau, Kokuriko-Zaka Kara

Outra categorias que sempre traz uma surpresa. Seria mais seguro colocar A Origem dos Guardiões como o quinto filme, mas acho que O Gato do Rabino tem chances. Não seria surpresa também vermos entre os indicados o francês Le Tableau ou o japonês Kokuriko-Zaka Kara (dirigido por Goro Miyazaki, filho de Hayao Miyazaki).

Melhor Roteiro Original

Minhas apostas: A Hora Mais Escura, Django Livre, Moonrise Kingdom, Looper e Amor

Também têm chances: O Mestre, Sete Psicopatas e Um Shih Tzu, O Voo

Não acredito que os indicados sejam diferentes dos citados acima. Única mudança pode ser o roteiro de O Mestre no lugar de Amor.

Melhor Roteiro Adaptado

Minhas Apostas: Argo, Lincoln, O Lado Bom da Vida, As Aventuras de Pi e Indomável Sonhadora

Também têm chances: As SessõesOs Miseráveis, O Exótico Hotel Marigold

O mesmo de roteiro original, só que vejo essa lista como mais fechada ainda.

Melhor Documentário

Minhas apostas: The Gatekeepers, The Invisible War, How to Survive a Plague, The Waiting Room e Central Park Five

Também têm chances: Searching for Sugar Man, Isto não é um Filme, Chasing Ice, Mea Maxima Culpa: Silence in the House of God, The House I Live In

A maior parte é chute. The Gatekeepers, The Invisible War e How to Survive a Plague me parecem os mais prováveis.

Melhor Montagem

Minhas apostas: Argo, A Hora Mais Escura, Lincoln, As Aventuras de Pi e Django Livre

Também têm chances: Os Miseráveis, 007 - Operação Skyfall, A Viagem

Uma categoria importante, já que restringe quem ganhará Melhor Filme - é muito raro um longa vencer o prêmio principal sem ser indicado em montagem. Os três primeiros entram de qualquer jeito. Os dois últimos podem sair e ceder espaço para Os Miseráveis ou Skyfall. Uma indicação para A Viagem seria muito merecida.

Melhor Fotografia

Minhas apostas: As Aventuras de Pi, Lincoln, 007 - Operação Skyfall, Os Miseráveis e Anna Karenina

Também têm chances: O Mestre, Django Livre, A Hora Mais Escura

Estou apostando nos mesmos indicados pelo sindicato da categoria. Mas os outros três também têm chances.

Melhor Direção de Arte

Minhas apostas: Os Miseráveis, Lincoln, Anna Karenina, Django Livre e Moonrise Kingdom

Também têm chances: O Hobbit: Uma Jornada Inesperada, As Aventuras de Pi, Prometheus

Categoria difícil, mas aposto nos mais prováveis, com O Hobbit correndo por fora.

Melhor Figurino

Minhas apostas: Os Miseráveis, Lincoln, Anna Karenina, Argo e Django Livre

Também têm chances: O Hobbit: Uma Jornada InesperadaBranca de Neve e o Caçador, Moonrise Kingdom, Espelho, Espelho Meu

O mesmo de Direção de Arte.

Melhor Maquiagem

Minhas apostas: O Hobbit: Uma Jornada Inesperada, Homens de Preto 3 e Lincoln

Também têm chances: Os Miseráveis, Looper, Branca de Neve e o Caçador, Hitchcock

Esta categoria possui uma pré-lista de sete indicados e só indica três concorrentes (vai entender...). Sempre costumam entrar blockbusters, por isso aposto forte em O Hobbit e MiB 3. Acho que Lincoln e Os Miseráveis brigam pela última vaga.

Melhores Efeitos Visuais

Minhas apostas: As Aventuras de Pi, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada, Os Vingadores, Prometheus e Batman: O Cavaleiro das Trevas Ressurge

Também têm chances: A Viagem, Branca de Neve e o Caçador, 007 - Operação Skyfall

O paraíso dos filmes pipoca. Minhas cinco apostas são as mais prováveis. O trabalho de A Viagem também é bem feito e podem chamar mais atenção que os efeitos "realistas" de Batman.

Melhor Trilha Sonora

Minhas apostas: Lincoln, Anna Karenina, As Aventuras de Pi, Indomável Sonhadora e Argo

Também têm chances: A Viagem, A Hora Mais Escura, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada, Valente

As cinco apostas são os nomes mais fortes. A Viagem corre por fora.

Melhor Canção

Minhas apostas: "Suddenly" (Os Miseráveis), "Skyfall" (007 - Operação Skyfall) e "Touch the Sky" (Valente)

Também têm chances: "Pi's Lullaby" (As Aventuras de Pi), "Strange Love" (Frankenweenie)

Categoria chata, com o número de indicados podendo variar, com o mínimo de dois e o máximo de cinco. Por isso, muito difícil de prever os indicados. Acho que as canções de Os Miseráveis e Skyfall entram. A de Valente também é bacana, então aposto nela também. O resto, não faço ideia.

Melhor Mixagem de Som

Minhas apostas: Os Miseráveis, A Hora Mais Escura, 007 - Operação Skyfall, O Hobbit: Uma Jornada Inesperada e Lincoln

Também têm chances: As Aventuras de PiOs Vingadores, Argo, Batman - O Cavaleiro das Travas Ressurge

Estou apostando nos mesmos indicados pelo sindicato da categoria. Mas As Aventuras de Pi, Os Vingadores e Argo também têm bons trabalhos de mixagem. Já sobre Batman, é preciso ver se a Academia gostou do trabalho na voz do Bane.

Melhor Edição de Som

Minhas apostas: A Hora Mais Escura, 007 - Operação Skyfall, O Hobbit: Uma Jornada InesperadaAs Aventuras de Pi e Os Miseráveis

Também têm chances: Lincoln, Os Vingadores, Argo, Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge

Geralmente os indicados de edição e mixagem de som são quase os mesmos. Aqui só mudo As Aventuras de Pi no lugar de Lincoln.


quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Amor


Muitos se surpreenderam quando Michael Haneke, autor de filmes controversos como Violência Gratuita, A Professora de Piano e Caché, anunciou que faria um longa sobre o amor. Como um cineasta, cuja maior característica de sua obra é o pessimismo com relação à humanidade, retrataria o mais nobre dos sentimentos? O diretor, no fim, filma uma história típica de sua filmografia: um casal de octogenários - Georges (Jean-Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva) - que vê sua rotina mudada quando ela sofre um AVC e tem que ser cuidada pelo marido. O resultado surpreendeu não só pela emoção, mas pela profundidade, além de ter tornado seu diretor como o único na história a receber a Palma de Ouro por dois filmes consecutivos (o anterior foi A Fita Branca).

Não que Haneke fuja de seu estilo. Ao contrário: o diretor não faz questão de usar qualquer tipo de trucagem para amplificar sensações. Seus planos são estáticos, longos, remetendo a um simples observador da situação. Os closes, típicos de filmes que lidam com fortes emoções, são raríssimos. A trilha sonora inexiste - as únicas músicas que ouvimos são diegéticas, ou seja, fazem parte do universo da história. Se determinados momentos chave do longa nos emocionam (e muito) é porque nos identificamos e compreendemos aqueles personagens, suas situações e seus sofrimentos, e não por algum artifício melodramático imposto pela direção.

Portanto, o sucesso do filme não existiria sem as atuações fantásticas de seu casal de veteranos atores - e se ela tem sido injustamente mais lembrada do que ele nesta época de premiações é mais por causa da natureza dos papéis e não pela atuação superior. Riva se entrega completamente e transforma a degeneração física de Anne em algo bastante realista com seu olhar confuso e a incapacidade de falar ou se movimentar. Ao mesmo tempo, consegue demonstrar a irritação da personagem ao se ver presa àquela situação, como nos momentos em que, teimosa, recusa-se a comer. Por outro lado, Trintignant cria um personagem sensível, que sofre intensamente por dentro, mas evita demonstrar sua dor. Seu carinho por Anne e sua relação de confidências é o que move o filme - e quando vemos que ele perde a paciência com a esposa, sentimos de imediato o seu arrependimento. A química entre o casal, portanto, é fundamental para a emoção do filme; e isso fica claro quando Haneke contrapõe duas falas à beira da cama de Anne, uma feita por Georges e outra por Eva (Isabelle Huppert), filha do casal: enquanto ele conta histórias de sua juventude, acalmando-a, Eva a agita com uma conversa enfadonha sobre cotação imobiliária.



Mas há um terceiro personagem importante no filme de Haneke: o apartamento de Georges e Anne. Em um trabalho de direção de arte impecável, o lar do casal reflete, durante toda a história, a evolução do drama pelo qual passam os dois. Inicialmente bastante mobiliado, o apartamento vai se adaptando à doença de Anne, perdendo seus móveis e sua decoração, restando apenas os quadros nas paredes - o que Haneke faz questão de frisar em determinado momento. É igualmente essencial o detalhe das portas sempre permanecerem fechadas, o que deixa a casa com um aspecto claustrofóbico e escuro, representando também o fato de que o casal quer reservar aquela dor para si, evitando interferências externas (mesmo que de uma simples pomba). Por isso a última cena do filme é tão importante (spoilers a seguir): ao notarmos a casa totalmente aberta e iluminada, vemos que o sofrimento realmente terminou - e não é à toa que a única porta ainda fechada seja a do quarto do casal.

E essa é a grande mensagem do filme, que o liga ao resto da filmografia de Michael Haneke: o amor, mais do que qualquer outro sentimento, só é verdadeiro quando é acompanhado de sofrimento. A dedicação e o carinho de Georges são acompanhados da dor e do desespero de ver a si mesmo e à pessoa amada naquela situação. Por isso o casal se recusa e evita falar sobre o estado de Anne, já que as visitas que recebem são o único momento em que podem 'fugir' daquela realidade. Já a decisão final de Georges é complexamente dúbia (spoiler!): ao mesmo tempo em que serve para se livrar de seu fardo, seu ato denota profunda compaixão, já que termina a dor daquela a quem tudo dedicou e por quem sofreu tanto.

Uma história de amor à la Michael Haneke, mas ainda assim uma bela história de amor.

Amour (Áustria, França, Alemanha; 2012). Dirigido por Michael Haneke. Com Jean-Louis Trintignant, Emmanuelle Riva, Isabelle Huppert, Alexandre Tharaud, William Shimell, Ramón Aguirre e Rita Blanco.