segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O favorito

O Discurso do Rei: de azarão a favorito em quinze dias

Há pouco mais de quinze dias, A Rede Social era considerado por muitos como o nome a ser batido na noite do dia 27 de fevereiro, quando o Oscar será entregue. Aclamado pela crítica e vencedor de praticamente todos os prêmios até então, o longa de David Fincher era a principal aposta para levar a estatueta. Aí veio a premiação dos produtores de Hollywood e o vencedor foi O Discurso do Rei. O favoritismo foi abalado, mas de forma ligeira, como se tivesse sido apenas um acidente de percurso. Mas depois do último fim de semana, já dá para cravar: não só A Rede Social perdeu o seu posto de imbatível como é praticamente certo que O Discurso do Rei será o grande vencedor do Oscar.

Tudo começou no sábado, com a maior surpresa dos últimos dias. O Oscar para David Fincher já era considerado como certo há algum tempo, mesmo se seu filme não vencesse o prêmio principal. Só que no sindicato dos diretores deu Tom Hooper. E, se não bastasse isso, no dia seguinte O Discurso do Rei foi premiado novamente, desta vez vencendo como Melhor Elenco no SAG Awards. A situação é simples: o filme inglês recebeu a maioria dos votos entre diretores, produtores e atores, muitos desses que também votam no Oscar. E, principalmente os últimos, com um grande peso devido ao alto número de membros da categoria. Para usar um trocadilho horrível, os fãs do filme sobre o Facebook não curtiram nada disso.

Aparentemente, ao contrário dos últimos anos, quando a Academia parecia ousar mais e premiar filmes mais jovens e modernos, voltaremos à tendência conservadora que fez história em várias premiações. Muitos já estão se lembrando de 1999, quando Shakespeare Apaixonado venceu O Resgate do Soldado Ryan depois de uma campanha agressiva dos irmãos Weinstein, na época dirigentes da Miramax. E adivinha de quem é a companhia que distribui O Discurso do Rei nos Estados Unidos? Pois é, dos mesmos irmãos. A história está se repetindo?

Além da possível definição do prêmio principal, também ficou claro quem deve vencer nas categorias de atuação. Colin Firth, Christian Bale e Natalie Portman já pareciam certos, ainda que restem dúvidas na categoria Melhor Atriz pelo fato de Annette Bening já ter sido indicada muitas vezes e nunca ter vencido. Na categoria Atriz Coadjuvante, parece que o ano será mesmo de Melissa Leo. Qualquer resultado além desses será uma grande surpresa.

sábado, 29 de janeiro de 2011

Um lugar qualquer

Sofia Coppola sempre foi fascinada por uma espécie de nobreza, pessoas bem sucedidas financeira e profissionalmente, mas que ainda assim possuem problemas existenciais. Sejam as meninas mais populares do colégio (As virgens suicidas), um ator famoso em decadência e a esposa de um bem-sucedido publicitário (Encontros e desencontros) ou uma rainha fútil e com tendências ao excesso (Maria Antonieta), a diretora/roteirista sempre apostou nesse universo. Em comum, os protagonistas viviam uma luta interna, mistura de solidão com a sensação de não-pertencimento àquele mundo.

Em seu novo trabalho, Um lugar qualquer, Coppola cria mais um personagem para essa galeria: pela primeira vez temos um protagonista homem, Johnny Carlo, ator hollywoodiano famoso (uma espécie de Tom Cruise ou Brad Pitt), vivido por Stephen Dorff. Solitário ao extremo em sua rotina de astro, acompanhamos alguns dias em sua vida, enquanto se preocupa se está sendo seguido por paparazzis, participa de entrevistas coletivas irritantes e tem que conviver com todos os puxa-sacos e egos inflados do star system. Seus únicos momentos mais felizes e autênticos são quando recebe a visita de sua filha, Cleo, interpretada com energia por Elle Fanning.


Com um ritmo lento, composto por planos longos, Coppola faz com que sintamos o mesmo enfado por que passa o protagonista. A diretora já havia mostrado antes (principalmente em Encontros e desencontros) sua capacidade de passar sensações apenas através das imagens, sem exposição excessiva. Não à toa, os primeiros 15 ou 20 minutos do filme quase não possuem diálogos, transmitindo a solidão e o tédio de Johnny. O longa só ganha ritmo e vida durante as visitas de Cleo e, quando ela parte, volta à lentidão anterior.

Mostrando-se mais madura do que em seus trabalhos anteriores, Sofia Coppola faz aqui uma filme quase autobiográfico. Filha de um diretor famoso (o fantástico Francis Ford Coppola), ela reflete em Cleo o sentimento de solidão que deveria sentir quando seus pais viajavam a trabalho e a deixavam sozinha. Além disso, Um lugar qualquer serve para desmistificar a vida de uma estrela de Hollywood, cheia de mordomias e regalias, mas longe do que chamaríamos de normal, sendo muitas vezes enfadonha e vazia.

Trazendo um belo casamento entre o plano inicial e o final - Johnny deixa de andar em círculos, preso à rotina, para se libertar e ir em linha reta rumo ao desconhecido -, Um lugar qualquer pode frustar alguns que esperavam por algum clímax mais claro e uma narrativa mais tradicional. Mas é um belo filme de uma diretora mais conhecida pelas sutilezas do que pelos excessos.

Somewhere (2010). Dirigido por Sofia Coppola. Com Stephen Dorff, Elle Fanning, Chris Pontius, Lala Sloatman, Amanda Anka, Ellie Kemper e Michelle Monaghan.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Inverno da alma


Em diversos aspectos, Inverno da alma lembra bastante outro longa produzido nos Estados Unidos nos últimos anos, Rio Congelado. Ambas as obras premiadas no Festival de Sundance, principal termômetro do cinema independente daquele país, revelam uma realidade dura dos confins da América. Acompanham histórias de pobreza, desilusão e sobrevivência no interior gelado e sem perspectivas num país conhecido pelas possibilidades.

Inverno da alma conta a história de Dee (Jennifer Lawrence), uma adolescente de 17 anos que, sozinha, tem que cuidar da mãe doente e dos dois irmãos pequenos. Seu pai criminoso foi preso e ao conseguir uma fiança para responder em liberdade, dá como garantia todos os bens da família. Próximo ao julgamento, ele não comparece à audiência e é dado como fugitivo, tendo Dee que encontrá-lo em uma semana, correndo risco de ser despejada.

A crueza da obra é clara desde o início. Todo o ambiente em que a protagonista vive é sujo, decadente, empobrecido. A bela fotografia com cores mortas demonstra a tristeza do local e a falta de esperança daqueles personagens. Dee vive num submundo em que as mulheres são submissas aos homens, que representam figuras de poder dentro dos lares. Sua independência forçada a distancia de todos, chegando muitas vezes a ser uma pessoa temida. Mas no fundo, ela é apenas uma jovem que abandona seus sonhos e carrega o peso e a reponsabilidade de cuidar sozinha da família tão cedo.


Nesse ponto, a atuação de Jennifer Lawrence é espetacular. Sempre com um olhar sério, postura firme e corajosa diante dos ameaçadores adultos ao seu redor, a garota ao mesmo tempo demonstra cuidado e carinho com os irmãos pequenos. Em determinado momento, ferida após uma briga, a primeira coisa que pergunta antes de finalmente descansar é se as crianças haviam feito o dever de casa. Uma personagem que carrega o filme, assim como o Teardrop vivido por John Hawkes, que no início parece ser mais um dos brutos homens da região, transformando-se durante a história em uma figura paterna importante para Dee.

Funcionando bem como thriller em sua segunda parte, Inverno da alma é um filme que se segura pelos grandes personagens e pela bela direção de Debra Granik.


Winter's bone (2010). Dirigido por Debra Granik. Com Jennifer Lawrence, John Hawkes, Isaiah Stone, Ashlee Thompson, Lauren Sweetser, Dale Dickey e Garret Dillahunt.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Biutiful

"Pai, como se escreve beautiful?"
"Da mesma forma que se diz."
"Com i?"
"Sim."

Uxbal (Javier Bardem) é um sujeito que vive no submundo. Alicia imigrantes ilegais, principalmente chineses, que vivem de forma desumana e em regime de trabalho praticamente escravo. É pai de duas crianças e cuida sozinho delas, já que a mãe passa boa parte de seus dias bêbada, drogada ou se prostituindo. Diante de todos esses problemas, ele descobre que está com câncer terminal e tem menos de dois meses de vida.

Alejandro González Iñarritu sempre apostou no melodrama e na tragédia como motores de seu filme. Em Biutiful, ele desiste do mosaico de histórias paralelas, marca de sua parceria com o roteirista Guillermo Arriaga em Amores Brutos, 21 Gramas e Babel, e aposta em apenas um protagonista. Não que aqui não exista a tentativa de desenvolver outros personagens, principalmente em pequenas narrativas envolvendo os imigrantes ilegais, mas o centro do filme é Uxbal.

Iñarritu continua com o mesmo estilo de direção mostrado em suas obras anteriores: câmera na mão e planos fechados, quase claustrofóbicos, no rosto de seus atores. Isso reforça o tom dramático e intimista do filme. O problema, talvez um resquício de Babel, seu último filme, é que seu roteiro (escrito junto com Armando Bo e Nicolás Giacobone) não se resume apenas ao drama dos personagens, tentando dar ares políticos à obra. Mesmo assim, a reflexão que o filme tenta fazer sobre imigração ilegal e os problemas da globalização, fica apenas na superficialidade e desvia o foco do longa.


Da mesma forma, apesar de seu estilo melodramático, Biutiful é bem mais frio do que se poderia imaginar. Muito pelo artificialismo do roteiro, que força a barra ao tentar criar sempre uma tragédia maior do que a outra. Ou também pelos personagens mal desenvolvidos, que beiram à caricatura, como a esposa de Uxbal, interpretada por Maricel Álvarez de forma constrangedora. Já a relação homossexual entre dois chineses que comandam o trabalho dos demais ilegais não acrescenta em nada à história principal, servindo apenas como engodo, tornando o filme mais longo do que deveria.

Uma pena, portanto, que a obra esteja aquém de seu protagonista. Uxbal, por mais que suas atitudes e ações sejam condenáveis, não faz as coisas por mal. Ele realmente acredita que, ao dar uma oportunidade aos ilegais, está ajudando a melhorar suas vidas. Sua reação ao saber da doença e o fato de saber que irá deixar seus filhos da mesma forma que foi abandonado por seu pai torna o personagem ainda mais complexo. A atuação de Javier Bardem é soberba, fazendo por merecer o prêmio recebido em Cannes e a indicação ao Oscar. O diálogo que abre esse texto, de Uxbal com a filha, resume bem o personagem: uma pessoa que tenta ao máximo fazer o que acredita ser certo, mesmo que não esteja correto perante à sociedade.

No meio de Biutiful há um belo drama sobre o amor entre pai e filhos. Mas a insistência de Iñarritu no melodrama e na relevância política de sua obra acaba enfraquecendo o que podia ser uma bela história.

Biutiful (2010). Dirigido por Alejandro González Iñarritu. Com Javier Bardem, Maricel Álvarez, Hanaa Bouchaib, Guillemo Estrella, Eduard Fernández, Diaryatou Daff, Cheng Tai Shen e Luo Jin.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas


Até meados do ano passado, Apichatpong Weerasethakul era conhecido apenas por espectadores de festivais e do circuito independente. Quando Tio Boonmee, que pode recordar suas vidas passadas ganhou a Palma de Ouro no Festival de Cannes 2010, seu estranho nome tornou-se famoso mundialmente por todos que acompanham cinema. Tio Boonmee é peculiar pelo fato de ser um filme diferente de tudo que chega às nossas telonas, o que o torna ainda mais interessante.

O tio do título, interpretado por Thanapat Saisaymar, está à beira da morte por causa de uma falência renal e resolve passar seus últimos dias de vida em uma fazenda no interior da Tailândia. Juntos estão um sobrinho e a irmã. É quando ele começa a receber visitas de sua esposa morta e de seu filho desaparecido, transformado em uma criatura da floresta.

A história assim descrita pode parecer linear, mas Weerasethakul não entende cinema como algo a ser resumido por sua narrativa. Ele utiliza a imagem para passar ideias acima de tudo. Pode parecer estranho ao espectador quando o filme interrompe a narrativa principal para mostrar um episódio envolvendo uma princesa, que aparentemente não tem nenhuma relação com Boonmee. Da mesma forma, a sequência final envolvendo a irmã de Boonmee e um budista poderia parecer dispensável se persarmos de forma casualística.


Mas Weerasethakul não tem essas preocupações. Seu filme é acima de tudo contemplativo. Os planos são longos, abertos. O tempo é bastante lento, tanto na duração das tomadas quanto no próprio ritmo das sequências e das atuações. Fundamental também é o design de som, que nos transporta exatamente para o mato, para as origens do homem e da vida.

Tio Boonmee é, enfim, um filme sobre a comunhão do homem com a natureza. A morte seria apenas mais uma etapa da existência. Fundamentado na cultura budista, Weerasethakul critica a alienação dos humanos, que se preocupam demais com questões puramente materiais como beleza, guerras e dinheiro. Nós só encontramos a paz quando deixamos de nos preocupar com essas coisas, seja através da morte (caso da mulher de Boonmee) ou pela fuga e retorno à natureza (como o filho). Não à toa que o protagonista decide morrer em uma caverna, debaixo da terra, na origem de tudo.

Apesar da exposição deste filme, é improvável que os próximos trabalhos de Weerasethakul ganhem mais espaço no circuito comercial, continuando restrito às mostras e festivais. É um tipo de cinema que revela um outro mundo, muito distante, mas que deveria ser bem mais conhecido e debatido.

Loong Boonmee raleuk chat (2010). Dirigido por Apichatpong Weerasethakul. Com Thanapat Saisaymar, Jenjira Pongpas, Sakda Kaewbuadee e Natthakarn Aphaiwonk.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Sem surpresas

Já faz um bom tempo que o Oscar não reserva uma surpresa, ainda mais entre os indicados. Com dez filmes concorrendo, aí é que fica ainda mais difícil acontecer algo diferente do que era previsto. Na maioria das listas feitas por especialistas antes do anúncio das indicações, a única diferença com relação à lista final era a presença de Atração Perigosa no lugar ou de 127 Horas ou de Inverno da Alma. Acabou que o filme de Ben Affleck não emplacou e tudo foi como o esperado.

Talvez a única grande novidade seja a ausência de Christopher Nolan entre os indicados a Melhor Diretor. Seu nome era dado como certo na lista e foi substituído pelo dos irmãos Coen. Mostra de ele parece não ter muita simpatia de seus colegas, sabe-se lá porquê. Na categoria, David Fincher é o franco favorito e só perde o prêmio se acontecer alguma catástrofe. Diferente da disputa entre os filmes, que parece ter ficado mais acirrada depois que O Discurso do Rei venceu a premiação dada pelo sindicato dos produtores. Mas A Rede Social ainda é favorito.

Entre os atores, as dúvidas eram somente em relação a um ou outro indicado. John Hawkes, de Inverno da Alma, entrou como Ator Coadjuvante e a ótima Jacki Weaver, de Reino Animal, ficou com a vaga que muitos davam como certa para Mila Kunis, de Cisne Negro, em Atriz Coadjuvante. Já Javier Bardem venceu a disputa com Robert Duvall pela última vaga de Melhor Ator. Nenhum deles deve vencer o prêmio, então a indicação já é uma vitória. Domingo tem o SAG Awards e deve ficar mais claro quais devem ser os premiados no dia 27 de fevereiro.

Vale registrar também que o Brasil será representado no Oscar pelo documentário Lixo Extraordinário, co-dirigido por João Jardim. É uma besteira essa obsessão que nós brasileiros temos em vencer a premiação, mas pode ser que esse ano a estatueta finalmente venha.

Atualização - 17h58: Como bem lembrou Renato Silveira, Lixo Extraordinário não deve ser considerado como representante brasileiro, já que foram indicados oficialmente apenas os produtores e diretores britânicos. Uma pena.

E sobre quem pode ser o ganhador, vale dar uma olhada no que escreveu Chico Fireman, aqui.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Além da vida


A sequência inicial de Além da vida, que mostra um tsunami destruindo uma cidade tailandesa, abre espetacularmente o novo filme de Clint Eastwood. Infelizmente, toda a tensão e a emoção dessa sequência some conforme o longa vai sendo desenvolvido. Eastwood, que sempre foi um diretor clássico, discreto e bastante eficiente ao contar uma história, aqui parece estar cansado e preguiçoso.

Além da vida, como diz o título, busca analisar a relação que as pessoas têm com a morte. Para isso, acompanha três histórias paralelas sobre o tema. A primeira, sobre uma jornalista francesa (Céline de France) que passa por uma experiência de quase morte durante a tragédia do início; a segunda, sobre um menino inglês (Frankie McLaren) que perde o irmão gêmeo em um acidente; e, por fim, a história de um médium (Matt Damon) que desiste de fazer atendimentos e tenta viver uma vida normal apesar de seu "dom". O filme segue um estilo linear de montagem, limitando-se a entrecruzar as narrativas sempre na mesma ordem, tornando o filme bem enfadonho e previsível.


É exatamente essa fragmentação que mais prejudica o longa. Quando estamos nos familiarizando com os personagens, somos de repente jogados para outro lado do mundo para acompanhar as outras narrativas. Há uma demora excessiva do roteirista Peter Morgan em entrelaçar as três histórias e, quando isso acontece, é feita de uma maneira bastante artifical. O filme também sofre pelo fato de determinadas narrativas serem mais interessantes que outras, sendo a história do médium mais fraca que as demais.

No fim, o Eastwood acaba não chegando a nenhuma conclusão. Ao mesmo tempo em que ataca os charlatões que, usando o nome de deus ou forjando "dons" que não possuem, enganam pessoas em momentos de fragilidade, ele também defende aqueles que acreditam em algo "além" e não são levados à sério. E não será um filme como este que vai mudar alguma coisa.

Hereafter (2010). Dirigido por Clint Eastwood. Com Matt Damon, Céline de France, Franckie McLaren, George McLaren, Bryce Dallas Howard, Thierry Neuvic, Lyndsey Marshal e Jay Mohr.

sábado, 22 de janeiro de 2011

O Turista


O Turista é um desastre no formato de um filme. Um longa policial sem nenhum tipo de tensão; uma comédia sem nada do que rir; um romance sem nenhuma inspiração. Seu relativo sucesso comprova só que um par de rostos conhecidos é capaz de levar milhares de pessoas para uma sala de cinema. O que surpreende é que o filme é dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck, que antes dessa tragédia havia dirigido o sensacional A Vida dos Outros.

O roteiro imbecil do próprio von Donnersmarck, junto com Christopher McQuarrie e Julian Fellowes, revela de pronto toda premissa sem nenhum mistério, trazendo-a mastigadinha para que o público – coitado! – não fique confuso. Elise Ward (Angelina Jolie), amante do golpista Alexander Pearce, está sendo vigiada pela Scotland Yard, que espera que, através dela, chegue ao criminoso. Para despistar os policiais ela conhece Frank Tupelo (Johnny Deep) em viagem à Veneza e faz com que acreditem que ele é o golpista. As coisas dão errado quando Reginald Shaw (Steven Berkoff), um milionário russo que sofrera um golpe do Pearce, também acaba perseguindo Frank.

A historinha boba até poderia render um filme engraçadinho, mas esquecível. O roteiro sequer se preocupa em ser crível, contendo vários furos e diálogos ridículos, repleto de piadinhas estúpidas com a língua italiana. Mas parece que todos no filme querem boicotar seu próprio trabalho, a começar pelo casal principal. Deep e Jolie sequer fazem esforço para atuar, dizendo suas falas sem nenhuma emoção ou entonação de voz, admitindo que estão ali só pelo dinheiro. Jolie em especial chama a atenção pela inexpressividade, enquanto que Deep até parece se divertir em determinados momentos, mas possui atuação medícore. Igualmente ruim é Paul Bettany, o policial que persegue o casal – mas seu personagem é tão imbecil que até Marlon Brando ficaria patético no papel.


Só que o grande incompetente é mesmo von Donnersmarck. Sem a mínima inspiração, o diretor erra em praticamente todas as sequências. A começar pelo tom do filme, que ele parece acreditar ser sério, provando que não deve ter sequer prestado atenção ao ler o roteiro. As cenas de ação, que poderiam ser um atrativo, praticamente inexistem – e quando aparecem são tão inverossímeis e mal feitas que fazem o espectador bocejar. A escolha da trilha sonora também é desastrosa, gerando um clima de melancolia (deveria ser romance?) que não casa em nenhum momento com o que está sendo mostrado na tela.

Com um final esdrúxulo e incoerente, mas ainda assim previsível, O Turista acaba sendo uma verdadeira sessão de tortura graças à péssima direção, mostrando que os milhões de Hollywood podem fazer muito mal até para bons profissionais.

The Tourist (2010). Dirigido por Florian Henckel von Donnersmarck. Com Johnny Deep, Angelina Jolie, Paul Bettany, Steven Berkoff e Timothy Dalton. 

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Bravura Indômita

Não é novidade a paixão de Joel e Ethan Coen pelo western. Filmes como Gosto de Sangue, Fargo e - principalmente - Onde os fracos não têm vez são bastante influenciados pelo gênero. Ao adaptar a obra de Charles Portis novamente para o cinema - a primeira versão é de 1969 e rendeu a John Wayne um Oscar de melhor ator - os irmãos finalmente realizam o sonho de dirigir um faroeste.

O filme acompanha a jovem Mattie Ross (Hailee Steinfeld), cujo pai é assassinado pelo criminoso Tom Chaney (Josh Brolin). Buscando vingaça, ela contrata o pistoleiro veterano - e bêbado - Rooster Cogburn (Jeff Bridges) para matar o fugitivo. Nessa busca, eles são acompanhados pelo texano LaBoeuf (Matt Damon), que também persegue Chaney por um crime cometido por ele em seu estado natal.

Assim como no filme de Henry Hathaway, o velho oeste aqui retratado não possui nenhum tipo de glamour ou heroísmo.  É um local decadente e sem vida. Cogburn, o protagonista, é um velho decadente, bêbado e caolho - num contraste que funcionava melhor no original, em que o personagem era interpretado por Wayne, consagrado em papéis de heróis rápidos no gatilho. Não que Jeff Bridges se saia mal, pelo contrário: seu Rooster Cogburn é cínico, rabugento e com uma prepotência de quem se acha mais capaz do que realmente é.


Mesmo os vilões não são tão amedrontadores, o que acaba sendo uma decepção, já que eles sequer representam uma amaeça real aos protagonistas. A grande heroína do livro de Portis - e dos dois filmes - é Mattie Ross. Nesse ponto, Hailee Steinfeld acaba sendo uma revelação. A jovem atriz estreante rouba todas as cenas e encanta pela determinação. Sua personagem consegue derrubar todos os homens selvagens do velho oeste com argumentos fortes e fala rápida - além de um bom advogado. A verdadeira "bravura" do título está mais em Mattie do que em quaquer pistoleiro.

Bravura Indômita acaba sendo um filme menor dos irmãos Coen, mesmo sabendo que, em se tratando dos diretores, é bem provável que uma segunda visita à obra a torne mais interessante do que vista pela primeira vez. De qualquer forma, é mais um acerto de uma filmografia rica e que deveria ser mais reconhecida pelos fãs de cinema.


True Grit (2010). Dirigido por Ethan e Joel Coen. Com Hailee Steinfeld, Jeff Bridges, Matt Damon, Josh Brolin, Barry Pepper, Paul Rae, Domhall Gleeson e Ed Corbin.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Não me abandone jamais

Não me abandone jamais se passa numa época em que os avanços da medicina fizeram com que a expectativa de vida dos seres humanos ultrapassasse os 100 anos. O filme acompanha três jovens (interpretados por Carey Mulligan, Keira Knightley e Andrew Garfield) durante a sua infância e seu posterior reencontro já como adultos, quando relembram a época que viveram juntos.

O diretor Mark Romanek aposta na fotografia dessaturada e nos planos abertos para demonstrar a solidão dos personagens. A bela trilha sonora também ajuda a pontuar os momentos melancólicos dessa triste história. Andrew Garfield e Keira Knightley oferecem boas atuações, mas quem acaba chamando mais atenção é Carey Mulligan. Ela cria uma personagem introspectiva e sensível, sendo a mais madura do trio. Uma prova de que sua indicação ao Oscar logo em seu filme de estreia (Educação) não foi ocasional.


Não me abandone jamais é um filme extremamente sensível, com momentos belos e dolorosos. Merecia ser mais lembrado nessa época de premiações, o que infelizmente não deve acontecer. Não vou revelar muito da história para não diminuir seu impacto, mas o filme nos leva a uma interessante reflexão. Apesar de parecer cruel e absurdo o destino dos protagonistas, essa é uma atitude perfeitamente compreensível por parte de uma espécie que, ao mesmo tempo em que desenvolveu a cura para muitas doenças, foi capaz de inventar o Holocausto e a bomba nuclear. Afinal, o “desumano” também não faz parte da nossa humanidade?

Never let me go (2010). Dirigido por Mark Romanek. Com Carey Mulligan, Andrew Garfield, Keira Knightley, Izzy Meikle-Small, Charlie Rowe, Ella Purnell, Charlotte Rampling e Sally Hawkins.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Desenrola

É difícil assistir a Desenrola e não se lembrar de As melhores coisas do mundo, lançado ano passado. Assim como aquele filme, o longa da diretora Rosane Svartmann retrata a juventude da classe média brasileira, com suas dúvidas e dilemas. A única diferença é geográfica: ao invés de São Paulo, a história aqui se passa no Rio de Janeiro. Só que ao contrário da obra de Laís Bodanski, mais sensível e profunda, Desenrola acaba apostando mais na comédia e nos clichês, o que torna a comparação entre os dois filmes possível de ser feita apenas pela superfície.

O filme conta a história de Priscila (Olivia Torres), que realiza o sonho de todo adolescente e fica 20 dias sozinha em casa depois que a mãe parte em uma viagem a trabalho. Nesse tempo, a menina aproveita para tentar conquistar o coração de Rafa (Kayky Brito) e conquistar o que parece ser o objetivo da vida da personagem (e de praticamente todos os jovens do longa): perder a virgindade. Durante esse processo somos apresentados a outros personagens que também passam por essa dilema, numa mistura de Malhação com American Pie.

Aqui temos a grande diferença entre os filmes de Bodanski e Svartmann: As melhores coisas do mundo também falava sobre as paixões da adolescência e das primeiras relações sexuais, mas não se resumia a isso; retratava acima de tudo as dúvidas e incertezas por quais passamos nessa fase da vida, desde as relações conflituosas com os pais até questões como assumir responsabilidades e tornar-se adulto. Já Desenrola abandona qualquer pretenção e é apenas uma comédia sobre adolescentes, com alguns momentos inspirados e outros nem tanto. O filme até tenta abordar temas mais complicados, como gravidez precoce e a descoberta da homossexualidade, mas eles são relegados ao segundo plano, recebendo um tratamento bastante superficial.

E como explicar a escalação de Pedro Bial (que desistiu definitivamente de ser jornalista e aqui se assume de vez como celebridade - mesmo ainda estando longe de ser considerado "ator")? A "inpretação" do apresentador nos joga completamente para fora do filme, nos dando a impressão de que estamos assistindo ao Big Brother na TV e não dentro de uma sala cinema. Outro que parece estar lá só pela fama é Kayky Brito, surgindo canastrão mesmo ao interpretar um personagem que é apenas músculos.

Apesar desses problemas, o elenco formado pelos jovens atores vai muito bem. As interpretações são seguras, realistas e sinceras. Destaque para a protagonista Olivia Torres e principalmente para os garotos Lucas Salles (Boca), Daniel Passi (Caco) e Vitor Thiré (Amaral). Todos aparecem muito naturais nos papéis, tanto nas cenas de humor quanto nas mais intimistas. São a alma da obra e por isso Desenrola acaba se tornando um filme verdadeiro acima de tudo, aproximando-o de seu público-alvo: os adolescentes.

Uma pena, portanto, que ele não consiga fascinar os espectadores mais maduros e nos fazer lembrar com nostalgia de quando todos éramos jovens e inseguros.

Desenrola (2011). Dirigido por Rosane Svartmann. Com Olivia Torres, Lucas Salles, Daniel Passi, Vitor Thiré, Kayky Brito, Marcela Barroso, Juliana Paiva, Claudia Ohana, Marcello Novaes, Letícia Spiller e Pedro Bial.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Cisne Negro

Cisne Negro é o irmão mais velho de O Lutador, filme anterior de Darren Aronofsky. Em diversos aspectos os longas se assemelham, seja pela temática ou pelo estilo. Se no primeiro o diretor mergulhava em um mundo intrinsecamente masculino (as lutas de vale-tudo) agora ele entra no universo feminino (o balé) com a mesma paixão. A protagonista é Nina (Natalie Portman), uma bailarina dedicada e superprotegida pela mãe que realiza seu sonho ao ser escolhida como protagonista do espetáculo "O Lago dos Cisnes", produzido pelo renomado Thomas Leroy (vivido por Vincent Cassel).

Assim como no longa de 2008, a câmera na mão de Aronofsky acompanha a protagonista em longas tomadas, seguindo seus passos. Essa dedicação à personagem fica clara com os planos fechados, esquecendo todo o mundo à sua volta - uma escolha acertada, já que o centro de Cisne Negro é exatamente o íntimo da protagonista. O trabalho de câmera também é primoroso durante as cenas dos ensaios e durante todo espetáculo final, retratando a fluidez de movimentos do balé - é como se tivéssemos sido transportados para dentro do filme e bailássemos junto com os atores.

Mas o filme não seria nada sem a atuação soberba de Natalie Portman. Vivendo uma personagem frágil, retratada pelo olhar inocente e pelo tom de voz inseguro, a protagonista esconde em seu interior sentimentos obscuros e complexos. É um insulto pensar que Portman não ganhe um mais que merecido Oscar por esse papel (apesar de eu ainda não ter visto Nicole Kidman em Rabbit Hole e de achar Jennifer Lawrence em Inverno da Alma espetacular). Quem também se destaca é Mila Kunis, que vive uma bailarina rival, esbanjando sensualidade.

Cisne Negro, acima de tudo, é um filme sobre a obsessão. Seus momentos mais chocantes lembram as obras do início da carreira de Aronofsky, como Réquiem para um sonho e Pi. Só que aqui eles vêm à tona como um pronfundo estudo de personagem e não são nada gratuitos. Nina, no fundo, é apenas mais uma dessas meninas frágeis de corpo e espírito, que se entregam à anorexia e à auto-mutilação em busca de um sonho. Nesse ponto, mais uma vez, ela não difere em nada do lutador vivido por Mickey Rourke, que também se flagelava ao tentar dar realismo às lutas que encenava. Aronofsky, mais uma vez, nos faz questionar até que ponto um ser humano pode ir por amor à sua arte.

Um longa maravilhoso de um diretor que a cada filme amadurece mais um pouco.

Black Swan (2010). Dirigido por Darren Aronofsky. Com Natalie Portman, Vincent Cassel, Mila Kunis, Barbara Hershey e Winona Ryder.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Os Globos influenciam o Oscar?


Hoje é dia da entrega do Globo de Ouro. Sempre nessa época vemos sendo espalhada por aí a ideia de que o prêmio é o principal termômetro para o Oscar, servindo como indicativo de quem será indicado e quem irá vencer as estatuetas da Academia. Talvez por falta de informação ou por auto-promoção, tenta-se vender essa ideia, facilmente aceita pelos preguiçosos de plantão, tornando-se uma espécie de senso comum da temporada de premiações.

Quem acompanha mais a fundo, sabe que a melhora maneira de "prever" o Oscar é através dos prêmios dos sindicatos e não pelos Globos. Estes são entregues por membros da imprensa estrangeira de Hollywood, enquanto naqueles os votantes são os próprios membros da Academia - os mesmos que tem poder de voto no Oscar. Logo, prêmios como o SAG Awards (dos atores), o DGA Awards (dos diretores) e o PGA Awards (dos produtores) são muito mais confiáveis como previsão do que qualquer outra premiação.

Isso quer dizer que o Globo de Ouro não influencia de forma alguma? Nada disso. Quer dizer que ele tem tanta influência quanto a Associação dos Críticos de Nova York ou o Festival de Toronto, com a vantagem de ter muito mais visibilidade na imprensa. Isso, claro, graças ao glamour e pelo fato de ser transmitido ao vivo pela TV. Mas os números mostram que essa influência é pequena, pelos menos no que se trata ao prêmio principal. Nos últimos sete anos, apenas em 2009 o vencedor do Globo de Ouro foi o mesmo do Oscar. Tem ficado claro que ao invés de influenciar, os Globos tentam prever quem irá ganhar a estatueta e têm se vendido como mais importantes do que realmente são.

A seguir, a lista dos vencedores do Globo de Ouro (de melhor drama e de melhor comédia/musical) e do Oscar nos últimos sete anos:

2005 - Globo: O Aviador e Sideways - Entre umas e outras; Oscar: Menina de Ouro

2006 - Globo: O Segredo de Brokebak Mountain e Johnny e June; Oscar: Crash - No Limite

2007 - Globo: Babel e Dreamgirls; Oscar: Os Infiltrados

2008 - Globo: Desejo e Reparação e Sweeney Todd; Oscar: Onde os fracos não têm vez

2009 - Globo: Quem quer ser um milionário? e Vicky Cristina Barcelona; Oscar: Quem quer ser um milionário?

2010 - Globo: Avatar e Se beber não case; Oscar: Guerra ao Terror

Ou seja, se A Rede Social confirmar hoje seu favoritismo e levar o Globo de Ouro para casa, não quer dizer que sairá como certo vencedor do Oscar. E, mesmo se levar a estatueta no dia 27 de fevereiro, a importância dessa possível vitória nos Globos não deve ser superdimensionada como querem seus organizadores.

Quem quer ser um milionário?, único filme nos últimos sete anos a vencer o Globo de Ouro e o Oscar

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Tron - O Legado

Vamos admitir: tirando alguns fanáticos por ficção científica, são poucos os que lembrariam hoje de Tron - Uma Odisseia Eletrônica. Filmado em 1982, o filme foi o primeiro a utilizar efeitos digitais em larga escala, mas seu roteiro confuso tornou o longa um tanto enfadonho. Hoje valeria apenas como curiosidade histórica, não ficando entre as obras mais memoráveis dos anos 80.

É curioso, portanto, que Hollywood tenha resolvido resgatar a história quase 30 anos depois. Trazendo como protagonista o jovem Sam Flynn (o insosso Garrett Hedlund), filho de Kevin Flynn (interpretado pelo mesmo Jeff Bridges do filme de 82), Tron - O Legado traz as ideias do original para o século XXI. Se naquela época Bill Gates mal havia criado a Microsoft e os conceitos de internet e interatividade estavam restritos apenas ao meio universitário, tornou-se inevitável adptar a história para abranger essa nova realidade. Ainda assim, podemos perceber uma certa igenuidade - também presente no primeiro longa - na maneira como a tecnologia e o mundo virtual são tratados. É como se o ciberespaço ainda fosse uma novidade inexplorada, não tendo havido nenhuma mudança nos últimos 28 anos na mentalidade de seus usuários.

Os roteiristas Edward Kitsis e Adam Horowitz não se preocupam muito em desenvolver e explicar a mitologia da série aos novos espectadores, o que é frustrante. Isso evidencia uma certa arrogância dos realizadores, que talvez imaginem o original como uma obra de relevância maior do que ela realmente tem, não havendo nenhuma introdução àquela realidade. É como se Kevin Flynn, a Grade e Tron fossem ícones de uma geração como Darth Vader, Spock ou os replicantes.

Assim como o longa de 82, Tron - O Legado aposta fortemente no visual e isso talvez seja seu único trunfo. Resgatando algumas marcas do original, como o design dos veículos e das roupas dos personagens, a fotografia nos mergulha num mundo sombrio, cujas unicas luzes são aquelas que representam os lados opostos na batalha (o azul dos mocinhos e o vermelho dos antagonistas). Vale como exercício assistir aos dois filmes e acompanhar como evoluiram os efeitos visuais criados por computador em 30 anos. Mesmo com tanto avanço, incomoda bastante a versão jovem de Jeff Bridges que, criada digitalmente, demonstra uma artificialidade que mais parece de um boneco de cera do que de um ser humano. 

Bridges, como era de se imaginar, acaba criando o personagem mais interessante do filme, mesmo com as limitações impostas pelo roteiro. Comparações com o "Dude" de O Grande Lebowski foram feitas e são pertinentes - apesar do ator desta vez não ter uma atuação tão memorável. Quem acaba roubando a cena nos poucos momentos em que aparece é Michal Sheen, que interpreta uma espécie de Ziggy Stardust do mundo digital.

Mas a maior decepção com relação ao filme fica por conta do mal uso do 3D. Há até a tentativa do diretor Joseph Kosinski em criar uma espécie de "efeito O Mágico de Oz" ao empregar o 3D apenas nas cenas passadas dentro da Grade. Só que o próprio cineasta acaba se boicotando, ao gravar o filme com profundidade de campo baixa na maioria de suas cenas e mudando constantemente o foco da imagem. Ora, se o longa aposta na visão tridimensional porque usar técnicas típicas da linguagem em duas dimensões? Há que se considerar os fatores econômicos (o filme precisa ser vendido também em 2D, principalmente as cópias em DVD e Bluray, já que a maioria dos lares ainda não possuem tal tecnologia), mas fica claro que há sérias limitações na linguagem.

Apesar da ótima trilha sonora da dupla Daft Punk, Tron - O Legado fica abaixo até mesmo do original, que já não era grande coisa. Em breve será relegado ao esquecimento, não servindo nem como curiosidade histórica para os fãs de ficção científica e tecnologia.

Tron: Legacy (2010) - Dirigido por Joseph Kosinski; Com Garrett Hedlund, Jeff Bridges, Olivia Wilde, Michael Sheen, James Frain e Beau Garrett.